domingo, 9 de agosto de 2009

PopCine
Um Circuito Popular de Cinema

O cinema, no Brasil, apesar da sua qualidade, da sua diversidade, do seu vigor, é um produto que não chega à maioria do povo, a não ser em casos excepcionais. Um mercado estruturado em bases alheias aos interesses dessa grande maioria limita a fruição do cinema a uma parcela muito pequena da população O cinema brasileiro ocupa cerca de 10% desse mercado, oscilando um pouco, para cima ou para baixo, entra ano, sai ano. E mesmo essa pequena fatia é geralmente ocupada por poucos títulos. A grande maioria dos filmes não ultrapassa alguns milhares de espectadores, num país com quase 200 milhões de habitantes! E muitos sequer são lançados nos cinemas.

No Brasil, 92% dos municípios não têm sala de cinema. Mais grave que isso: mesmo nas cidades principais, menos de 9% dos habitantes vão ao cinema “pelo menos uma vez por ano”. Ou seja, o cinema em geral não chega à população. O que é uma das razões complementares para o cinema brasileiro continuar nesse círculo vicioso de exclusão mútua: a população não vai ao cinema e o cinema brasileiro não chega à população.

O PopCine - Circuito Popular de Cinema foi pensado justamente em função desses dois pólos: o espectador popular - os 92% da população que julgamos serem os maiores interessados em ver o cinema brasileiro - e o cinema nacional (mas igualmente o cinema mundial em geral, igualmente ausente da lógica desse mercado estreito), que precisa desse espectador como nutriente da sua criatividade, como razão da sua expressividade e, finalmente, como base da sua reprodução econômica.

A tecnologia digital abre oportunidade para criar um circuito de salas de cinema baratas na construção ou adaptação; um sistema de distribuição com custos infinitamente inferiores ao do circuito tradicional, baseado em película, e, finalmente, permite cobrar um ingresso mais próximo da capacidade aquisitiva real da maior parte da população.

O Circuito Popular de Cinema visa criar uma rede de pequenas salas, em torno de 100 lugares, com meios de exibição bem simples - mas sem descurar de qualidade e conforto - que volte a ocupar os espaços abandonados pelo modelo de cinema que foi implantado no País principalmente depois dos anos 70. E com ingressos accessíveis. Baseado nos meios digitais, pretende em grande parte reviver a relação que o cinema tinha com o público até aquela década, quando o ingresso custava uma média de um dólar e o cinema, nos bairros, nas cidades do interior, nas ruas, tinha um público anual duas ou três vezes superior à nossa população.

O PopCine não tenciona concorrer com o mercado comercial, cuja sofisticação e tecnologia não pretende imitar. Tampouco pensa prejudicar as “janelas” em que o mercado está estruturado. De fato, achamos que os efeitos desse novo circuito serão vivificadores: atingindo o público sem grande poder aquisitivo, nas suas comunidades, estará ampliando o mercado, ao invés de concorrer com ele. Com ingressos inferiores ao preço cobrado pela cópia pirata vendida nas cercanias dos cinemas tradicionais, ajuda a combater esse comércio predatório. Para os filmes de pouco público no modelo atual, ampliará não só a exibição, mas sua exposição como mídia mesmo, como elemento de estímulo à venda e locação de cópias para consumo domiciliar nas localidades onde o filme nunca chegou.

Se apenas 5 salas iniciais mantiverem um filme em cartaz durante um mês por exemplo, com taxas de ocupação similares às médias do próprio mercado, já estarão atingindo um público igual ou superior ao que muitos filmes estão conseguindo este ano. E são salas ligadas às comunidades, animadas por entidades e equipes locais, com uma capacidade de estímulo própria desse enraizamento em seu próprio meio.

A equipe organizadora do PopCine já percorreu diversas localidades, está conversando com personalidades, entidades e grupos de bairros, comunidades, cidades de todos os tamanhos: a aceitação do projeto é praticamente unânime. A receptividade junto aos cineastas e produtores também tem sido total; exibidores que consultamos concordam com essa iniciativa que pode sacudir positivamente os hábitos de freqüência ao cinema no nosso País.

Isto é o PopCine: a oportunidade concreta do público brasileiro ter acesso ao cinema de maneira sistemática e permanente; a chance do cinema brasileiro, de um cinema plural e internacional, chegar ao público brasileiro.


Resumo do Projeto

O projeto apóia-se em três elementos principais:

1) Projeto e montagem salas de cinema com tecnologia digital bem simples, mas de qualidade e conforto em tudo comparáveis às salas tradicionais de cinema (fotos no material anexo). Essas salas são montadas em espaços adaptados de imóveis relativamente comuns, com área média de 100 m2 para a platéia e outra área semelhante para sala de espera, bar-bomboniére, etc. O espaço deve ser cedido por uma parceria local, geralmente com uma prefeitura ou outro órgão da administração municipal em cidades maiores. O custo de instalação, com equipamento completo, gira em torno de R$ 150 mil, dependendo do imóvel. Assim, as salas podem ser instaladas principalmente em bairros e/ou cidades onde não há salas de cinema.

b) As salas cobram um ingresso proporcional, visando a sua manutenção e a remuneração dos filmes programados – o projeto envolve, portanto, uma distribuidora. Com um número razoável de sessões, estudado caso a caso, e uma taxa de ocupação comparável à do mercado, é possível gerar uma receita que cobre os custos de manutenção, mão de obra e, eventualmente, de capital. Outras fontes de capitalização convergem para dar sustentabilidade à sala: receitas de outras atividades (eventos, etc), do bar-bomboniére e de convênios com outras áreas do município, do estado ou do governo federal, em especial com escolas. Assim, essas salas, além de formarem uma equipe de ação cultural, permitem a profissionalização de um número variável de pessoas da comunidade: geram emprego - especialmente para jovens e sem exigir grande qualificação formal.
Uma parte da receita é reservada para a remuneração do circuito propriamente dito: elaboração (autoração) de cópias, material de divulgação (trailers, cartazes, etc), assessoria e controles (inclusive site interativo).
Além dos custos de manutenção, 35% da receita é reservada para a remuneração dos filmes exibidos; a partir de um certo número de salas esta receita começa a ter importância para a produção. O projeto prevê a manutenção de um site interativo, com acesso on-line e em tempo real, através de senha, para que os produtores possam acompanhar os resultados de seus filmes, sessão por sessão e sala por sala.

c) A formação, treinamento e assessoria permanente das equipes gestoras da referidas salas. O projeto funciona com alguns aspectos semelhantes ao de uma franquia: além de cursos e outras formas de treinamento inicial, a coordenação do circuito mantém uma assessoria permanente às salas, acompanhando a gestão, aspectos jurídicos, programação, divulgação, etc.

Essas salas podem se articular com diversas iniciativas já existentes, funcionando como pontos de apoio à circulação de materiais audiovisuais – e outros – com grupos “menos estruturados” e também como núcleos de formação e treinamento para outras ações.

Cada sala é um auditório multimídia de que passa a dispor a comunidade, é um espaço com recursos audiovisuais para a promoção de inúmeras ações e é, também, um núcleo com uma equipe organizada e “profissionalizada” para ancorar, reforçar e expandir programas diversos de interesse da comunidade e dos órgãos públicos que nela atuem.

Em quase dois anos de preparação, negociações e experiências, levantamos mais de 100 localidades interessadas em todo o País (o projeto gera interesse igualmente na Argentina e no México, e foi apresentado em encontro internacional, na Itália, por solicitação da Federação Internacional de Cineclubes): secretarias estaduais de cultura, prefeituras, instituições de todo tipo, em pelo menos 13 estados, já se dispuseram a ceder os locais. Mas, verdade seja dita, nenhuma instituição, pública ou privada (fora a Secretaria de Cultura de São Paulo na gestão do cineasta João Batista de Andrade), dispõe-se a fazer o investimento inicial necessário.

Do ponto de vista do cinema brasileiro, o PopCine é um investimento em um paradigma diferente, em que o público tem acesso ao cinema graças ao ingresso mais barato e à capilaridade do circuito, que diminui os custos de transporte. Um público que, como sabemos, prestigia nosso cinema “sempre que lhe é permitido ter acesso a ele”.

Um comentário:

  1. Bom dia!
    Qual é a possibilidade deste projeto usar projetor 35mm portatil?
    Em pelo menos algumas salas que tiverem interese neles?!
    Seria possivel isto?
    Usando talvez um outro tipo de recurso para financiar o mesmo, como a lei Rouanet?
    Obrigado.

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